quarta-feira, 25 de maio de 2011

Reator UASB (Sistema de Baixo Custo)

Nos anos após o desenvolvimento dos sistemas de segunda geração o digestor anaeróbio de fluxo ascendente, UASB, tem se destacado por ser muito mais aplicado que os outros. Os UASB são reatores de manta de lodo no qual o esgoto afluente entra no fundo do reator e em seu movimento ascendente, atravessa uma camada de lodo biológico que se encontra em sua parte inferior, e passa por um separador de fases enquanto escoa em direção à superfície.
O UASB que no Brasil inicialmente foi nomeado como digestor anaeróbio de fluxo ascendente (DAFA) foi desenvolvido na década de 70 pelo Prof. Lettinga e sua equipe, na Universidade de Wageningen - Holanda. Saliente-se aqui, que a Holanda tem se destacado a partir do final dos anos 60 pelo substancial avanço na campo da tecnologia da clarificação de águas residuárias.

Universidade de Wageningen – Holanda

Hoje este tipo de reator encontra-se bastante difundido e tem sido aplicado para tratamento de muitos tipos de águas residuárias, sendo o aspecto essencial do processo a natureza da biomassa ativa.


FUNCIONAMENTO:
O reator Uasb em sua coluna ascendente consiste de um leito de lodo, uma zona de sedimentação, e o separador de fase. Este separador de fases, um dispositivo característico do reator (van Haandel e Lettinga, 1994), tem a finalidade de dividir a zona de digestão (parte inferior), onde se encontra a manta de lodo responsável pela digestão anaeróbia, e a zona de sedimentação (parte superior). A água residuária, que segue uma trajetória ascendente dentro do reator, desde a sua parte mais baixa, atravessa a zona de digestão escoando a seguir pelas passagens do separador de fases e alcançando a zona de sedimentação.

A água residuária após entrar e ser distribuída pelo fundo do reator UASB, flui pela zona de digestão, onde se encontra o leito de lodo, ocorrendo a mistura do material orgânico nela presente com o lodo. Os sólidos orgânicos suspensos são quebrados, biodegradados e digeridos através de uma transformação anaeróbia, resultando na produção de biogás e no crescimento da biomassa bacteriana. O biogás segue em trajetória ascendente com o líquido, após este ultrapassar a camada de lodo, em direção ao separador de fases.


No separador de fases, a área disponível para o escoamento ascendente do líquido deve ser de tal  forma que o líquido, ao se aproximar da superfície líquida livre, tenha sua velocidade progressivamente reduzida, de modo a ser superada pela velocidade de sedimentação das partículas, oriundas dos flocos de lodo arrastados pelas condições hidráulicas ou flotados. Isto possibilita que este material sólido quepassa pelas aberturas no separador de fases, alcançando a zona superior do reator, possa se sedimentar sobre a superfície inclinada do separador de fases. Naturalmente que esta condição dependerá das condições hidráulicas do escoamento. Desse modo, o acúmulo sucessivo de sólidos implicará consequentemente, no aumento contínuo do peso desse material o qual, em um dado momento, tornar-se-á maior que a força de atrito e, então, deslizarão, voltando para a zona de digestão, na parte inferior do reator. Assim, a presença de uma zona de sedimentação acima do separador de fases resulta na retenção do lodo, permitindo a presença de uma grande massa na zona de digestão, enquanto se descarrega um efluente substancialmente livre de sólidos sedimentáveis (van Haandel e Lettinga, 1994).
Na parte interna do separador de fases fica a câmara de acumulação do biogás que se forma na zona de digestão. O projeto do UASB garante os dois pré-requisitos para digestão anaeróbia eficiente: a) através do escoamento ascensional do afluente passando pela camada de lodo, assegura-se um contato intenso entre o material orgânico e o lodo e b) o decantador interno garante a retenção de uma grande massa de lodo no reator (van Haandel e Catunda,1995). Com o fluxo ascendente a estabilização da matéria orgânica ocorre na zona da manta de lodo, não havendo necessidade de dispositivos de mistura, pois esta é promovida pelo fluxo ascensional e pelas bolhas de gás (Oliva, 1997).

FORMATOS:
Os reatores anaeróbios de manta de lodo foram inicialmente concebidos para tratamento de efluentes industriais como estruturas cilíndricas ou prismático-retangulares, nos quais as áreas dos compartimentos de digestão e de decantação eram iguais, configurando-se, portanto, reatores de paredes verticais. A  adaptação destes reatores para tratamento de águas residuárias de baixa concentração (como os esgotos domésticos) tem levado a diferentes configurações em função dos aspectos principais descritos a seguir:

  Esquemas mais freqüentes de formas de reatores UASB


OPERACIONALIDADE:
Quanto às medidas para acompanhamento de um reator anaeróbio de manta de lodo, segundo Chernicharo et al., 1997, o sistema de amostragem deve ser constituído por uma série de registros instalados ao longo da altura do compartimento de digestão a fim de possibilitar a monitoração do crescimento e da qualidade da biomassa no reator. Uma das rotinas operacionais mais importantes neste sistema de tratamento consiste em avaliar a quantidade de biomasssa presente no reator através da determinação do perfil dos sólidos e da massa de microrganismos presentes no sistema e a atividade metanogênica específica desta massa. Esse monitoramento possibilitará à operação maior controle sobre os sólidos do sistema, identificando a altura do leito de lodo no reator, possibilitando o estabelecimento de estratégias de descarte (quantidade e freqüência) e determinação dos pontos ideais de descarte do lodo, em função dos resultados dos testes de atividade metanogênica específica e das características do lodo. A avaliação do lodo anaeróbio também é importante no sentido de classificar o potencial da biomassa na conversão de substratos solúveis em metano e dióxido de carbono. Para que essa biomassa possa ser preservada e monitorada, torna-se necessário o desenvolvimento de técnicas para a avaliação da atividade microbiana dos reatores anaeróbios, notadamente as bactérias metanogênicas.

Para efeito de avaliação da situação interna recomenda-se a instalação de pontos de coleta de amostras construídos com tubulações dotadas de registros a partir da base do reator com as seguintes características: espaçamento de 50 centímetros com saídas de 40 ou 50 milímetros, controladas com registros de fechamento rápido tipo esfera. 
Medidas de avaliação da concentração de sólidos voláteis podem ser efetuadas a partir da determinação das concentrações amostrais conseguidas nos pontos de coleta do reator possibilitam a estimativa da massa de microrganismos e a sua distribuição ao longo do reator, tanto por setores como no total da coluna.
Um aspecto operacional importante em um sistema com lodos em suspensão como no caso do reator UASB, é a descarga de lodo de excesso. A sistemática de descarte do lodo destina-se a extração periódica de parcela deste lodo, que cresce em excesso no reator, possibilitando também a retirada de material inerte que eventualmente venha a se acumular no fundo do reator.
Este descarte tem que obedecer duas recomendações básicas: a retirada deve ocorrer quando a capacidade de retenção do reator estiver exaurida e o residual deve ficar em um mínimo de modo que não haja prejuízo na continuidade do processo de digestão da matéria orgânica afluente. Devem ser previstos pelo menos dois pontos de descarte, um junto ao fundo e outro a aproximadamente 1,0 a 1,5 metro acima, dependendo da altura do compartimento de digestão, de forma a propiciar maior flexibilidade operacional. Recomenda-se tubos ou mangotes de 100 milímetros de diâmetro para escoamento do lodo de descarte.



PRODUÇÃO DE LODO:
Nos reatores tipo UASB, o controle do fluxo ascendente é essencial, pois a mistura e retenção da biomassa adequados, permitem que o lodo permaneça em suspensão com uma mobilidade limitada em um espaço na vertical do interior do reator. A mistura do afluente com essa biomassa é favorecida pela agitação hidráulica promovida pelo fluxo ascensional, por efeitos de convecção térmica e do movimento cone Imhoff permanente de bolhas de gases produzidos no processo digestivo da atividade bacteriana. É provável que ocorram situações em que o movimento ascensional das bolhas gasosas seja o mais importante no processo de mistura.


Essa dinâmica é essencial para que o processo anaeróbio por meio desse tipo de reator de manta de lodo se desenvolva e se mantenha em elevada atividade e com ótima capacidade de sedimentação.
O desenvolvimento do lodo anaeróbio é resultante da transformação da matéria orgânica no sistema.
Como este crescimento é contínuo, isto implica na necessidade periódica de descarte de parcela do volume de lodo acumulado, como certamente teria de ocorrer com qualquer outro sistema de tratamento de afluentes de águas residuárias, sob pena do processo perder eficiência na qualidade do efluente.
Porém, justamente em função da baixa taxa do volume gerado no processo anaeróbio, cerca de 0,10 a 0,20 kg SST/ kg DQOafluente, (Campos, 1999), entre outros, é neste aspecto que o sistema anaeróbio se torna mais vantajoso que os aeróbios.
Caso não haja uma boa separação das fases sólida-líquida, fazendo com que no reator permaneça a biomassa ao longo de toda sua coluna, e/ou não sejam feitos descartes periódicos adequados, haverá excesso de lodo perdido através do efluente, reduzindo a qualidade de seu efluente. O tempo de detenção hidráulica também é um fator importante nesta consideração e, na maioria das vezes, deve estar entre 6 e 10 horas (Campos, 1999).
Para que se tenha controle destes fatores negativos, faz-se necessária uma avaliação da DQO do efluente decantado. Este procedimento é obtido com a decantação desse efluente em cone Imhoff por uma hora, sendo que este decantado deve produzir um valor de 40 a 20 % de valor da DQO do afluente (Campos, 1999).

 cone Imhoff

A partir dos resultados operacionais dos reatores de Bucaramanga, Cali, CETESB e Kampur, foi obtida uma equação que representa a concentração de sólidos esperada para o efluente (Campos, 1999), representada da seguinte forma:

SS = (250 / TDH) + 10, onde

SS - concentração de sólidos suspensos no efluente em mg/l,

TDH - Tempo de detenção hidráulica em horas e

250 e 10 são constantes empíricas.


EFICIÊNCIA:
O tratamento de esgotos utilizando reator UASB constitui um método eficiente e relativamente de baixo custo para se removerem matéria orgânica e sólidos em suspensão, diminuindo consideravelmente o potencial poluidor dos esgotos após o tratamento (Bezerra et al.,1998).
Para um mesmo tempo de detenção a razão área/profundidade não influi marcadamente sobre a eficiência de remoção do material orgânico e a massa de sólidos voláteis varia muito pouco com o tempo de detenção e a configuração dos reatores (Sousa et al. , 1998).
Enquanto o reator não estiver cheio de lodo, uma parte do lodo produzido acumular-se-á no seu interior, enquanto outra parcela será descarregada junto com o afluente. Esta parte descarregada cresce com a redução do tempo de detenção hidráulica Para evitar que o lodo produzido seja descarregado junto com o efluente, diminuindo a qualidade, periodicamente são executadas descargas de lodo de modo a aliviar o volume de material sólido acumulado no interior do reator. Normalmente a capacidade de digestão do lodo acumulado num reator UASB tratando esgoto doméstico é muito maior do que a carga orgânica de modo que se pode dar descargas grandes de lodo de excesso sem prejudicar a eficiência ou a estabilidade operacional do reator. Segundo Medeiros et al., 1998, para tempos de detenção hidráulica de 4 a 8 horas é possível dar descargas de 50 a 60% da massa de lodo sem prejuízo do seu desempenho. Descargas de 80 % resultam numa redução temporária da eficiência de remoção da DQO e um aumento da concentração de ácidos voláteis no efluente, sem contudo ameaçar a estabilidade operacional.
O lodo também pode conter uma fração orgânica inerte que se origina da floculação de matéria orgânica biodegradável, mas particulada presente no afluente e, dependendo das condições operacionais, é possível que apareçam no efluente juntamente com outras partículas não metabolizadas, resultante de inadequadas condições hidráulicas ou de população bacteriana insuficiente. Outro problema que pode afetar o rendimento é volume do resíduo endógeno que, sabe-se, cresce com o prolongamento do período de atividade da massa bacteriana.


UASB COMO PRÉ-TRATAMENTO:
A aceitação do reator anaeróbio como principal unidade de tratamento, deve-se à constatação de que esta unidade pode remover em torno de 70 % da matéria orgânica sem dispêndio de energia externa ou adição de substâncias químicas. Assim unidades posteriores podem ser usadas sem cuidados prévios para remoção de parcelas remanescentes.

Estações mistas de tratamento de esgotos têm sido projetadas com muita freqüência ultimamente e funcionado satisfatoriamente, com unidades anaeróbias seguidas de aeróbias, trazendo melhores resultados aliados a menores custos que as tradicionais exclusivamente aeróbias.


VANTAGENS DOS REATORES UASB:
• Eficiências de remoção em torno de 70%.
• Sistema pode ser enterrado (Invisível).
• Não espalha odores.
• Não causa proliferação de insetos
• Pequena produção de lodo
• Operação e manutenção são extremamente simples.
• Eficiências superiores a 95% se combinado com sistemas aeróbios.

VARIAÇÕES DE VAZÃO:
A vazão de projeto é o parâmetro inicial mais importante para dimensionamento de uma unidade de tratamento de esgotos. No caso específico de reatores UASBs que operam a taxas elevadas (TDH entre 4 e 6 horas), variações bruscas de vazão podem levar a sobrecargas hidráulicas volumétricas, reduzindo o desempenho dessas unidades pois, quando há perdas de sólidos biológicos conseqüentemente há queda no rendimento do reator.
Especificamente, os sistemas coletores de esgotos domésticos são caracterizados por apresentarem significativas variações de vazão. Nos coletores de esgotos as flutuações mais interessantes para efeito de projeto são as horárias e dependem da simultaneidade das descargas e das distâncias a serem percorridas até às unidades de tratamento. As variações diárias e mensais, as quais estão diretamente relacionadas com a curva de consumo de água, dependem, pois, dos fatores que afetam o comportamento desta curva e com as possíveis infiltrações subterrâneas e ligações clandestinas de águas de origem pluvial.
Na entrada das estações de tratamento, em função da extensão da rede, estas flutuações podem estar amortecidas, considerando que, hidraulicamente, quanto maior o percurso maior será o amortecimento dos picos de vazão, associado à defasagem entre os pontos de contribuição distribuídos ao longo da rede coletora.
Porém, nem sempre é possível reunir todas as vazões em um só destino final a não ser que sejam projetados recalques de uma ou mais bacias de esgotamento para uma canalização a jusante (sistemas distritais), originando pulsos de vazões bombeadas que poderão ocorrer de forma simultânea com outros efluentes de elevatórias, alterando sensivelmente a vazão de trabalho da unidade de tratamento e reduzindo, pois, seu tempo de detenção e, consequentemente, seu rendimento.

Em geral, quando se deseja projetar sistemas de esgotos sanitários, recomenda-se que as variações de vazão sejam cuidadosamente avaliadas, através de dados de campo ou de dados de áreas com características  semelhantes à desejada, ao invés de adotarem-se dados clássicos da literatura.